SUSEP MUDA COMANDO E SEGURADORAS SE DIVIDEM






21/07/2016

Por Eduardo Campos, Raphael Di Cunto e Daniela Meibak

De saída do comando da Superintendência de Seguros Privados (Susep), Roberto Westenberger deixa o cargo pedindo a seu sucessor que dê continuidade aos projetos iniciados na sua gestão e conclua os que já estão em andamento. Disse esperar que a Fazenda tenha se pautado pelos critérios já anunciados de inquestionável reputação técnica para a escolha de seu sucessor. "A Susep tem que estar subordinada ao Estado, não ao governo", diz.

Mas, em busca de apoio no Congresso, o presidente interino Michel Temer escolheu o tesoureiro do partido Solidariedade de Goiás e presidente do Sindicato dos Corretores e das Empresas Corretoras de Seguros de Goiás (Sincor-GO), Joaquim Mendanha de Ataídes, para comandar a autarquia responsável pelo controle e fiscalização dos mercados de seguros, previdência privada aberta, capitalização e resseguro.

Ataídes é indicação do deputado federal Lucas Vergílio (SD-GO) e de seu pai, o ex-deputado Armando Vergílio (SD-GO), que foi superintendente da Susep de 2007 a 2010 indicado pelo PTB e que, após deixar o cargo, foi alvo de investigação da Procuradoria-Geral da República por um reajuste que teria beneficiado corretores e seguradores em detrimento dos consumidores.


O Ministério da Fazenda ainda não confirma a troca na autarquia, mas, segundo o Valor apurou, a exoneração Westenberger e a nomeação de Ataídes estão previstas para o "Diário Oficial da União" (DOU) de sexta-feira. A ordem no governo é apressar as nomeações após a eleição para a presidência da Câmara dos Deputados.

As seguradoras divergem sobre a mudança no comando da Susep, segundo fontes ouvidas pelo Valor. Por um lado, seguradoras ligadas aos bancos estão com o pé atrás em relação à mudança; de outro, as independentes acham a alteração positiva.

Segundo uma seguradora ligada a grande banco brasileiro, hoje existe uma disputa entre os corretores e os canais bancários, uma vez que algumas pautas do setor caminham na direção de reduzir a participação da figura do corretor na venda dos seguros. De acordo com essa fonte, a indicação de um representante dos corretores afetaria essa tendência. Já para seguradoras independentes, que dependem diretamente da figura do corretor para a venda dos produtos, a mudança seria mais positiva.

"Westenberger bateu de frente com o segmento de corretores, então a vinda de um representante da Sincor para a Susep é muito positiva. É uma pessoa que atua na ponta da cadeia e sabe dos problemas do dia a dia", afirmou uma fonte de uma seguradora independente. "Ele sabe o que o cliente demanda, tem uma análise mais empírica. Reforça o posicionamento do governo de dar mais voz ao mercado", completa.

Westenberger assumiu há dois anos, no lugar de um indicado do líder do PTB, Jovair Arantes (GO), que afirmou não ficar incomodado em perder a indicação para o SD. "Nós temos parceria com o Solidariedade e o que o partido indica nós apoiamos", afirmou.

A troca é mais uma concessão do governo Temer a aliados, embora o discurso oficial do Palácio do Planalto seja a redução das nomeações políticas. O SD, partido do deputado federal Paulinho da Força (SP), foi um dos mais ativos a favor do impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff.

A família Vergílio é uma das principais lideranças do SD. O pai, Armando, é corretor de seguros e atuou como superintendente enquanto presidente licenciado da Federação de Corretores de Seguro, entidade que lhe deu sustentação para ser eleito deputado federal em 2010. Ele concorreu a vice-governador em 2014, foi derrotado, mas elegeu o filho deputado.

Em agosto de 2013, o Supremo Tribunal Federal autorizou abertura de inquérito contra Armando Vergílio para investigar uma circular normativa da Susep, editada dias antes de deixar o cargo, que tornou obrigatória e aumentou de R$ 60 para R$ 100 da taxa de emissão de apólice, faturas e endossos em contratos de seguros. O filho, Lucas, ficou conhecido por ser o deputado que dedicou o voto favorável ao impeachment "aos corretores de seguro". Ele é vice-presidente do Sincor-GO, presidido por Ataídes, e assumiu como tesoureiro do SD de Goiás ontem.

A reportagem tentou contato com a família Vergílio, mas não teve retorno até o fechamento desta edição. À Justiça, Armando argumentou que a circular foi aprovada por unanimidade pela direção da Susep e não causou prejuízo nos consumidores. Disse ainda que não foi beneficiado pelo aumento porque suspendeu a licença de corretor antes de entrar na Susep.

O agora ex-superintendente afirmou ontem ao Valor PRO, serviço de notícias em tempo real do Valor, que conseguiu entregar o que se propôs a fazer quando assumiu a Susep, mas que tem a frustração de não concluir um grande projeto, que está no Congresso (PL 5.277) e cria a estabilidade para os gestores da Susep. Eles passariam a ter mandato fixo, afastando demissões por questões políticas.

Apesar de já ter recebido convites da iniciativa privada, Westenberger afirmou que, por ora, vai descansar. Mas não descarta voltar ao mercado de consultoria. Ele também é professor da UFRJ. Segundo Westenberger, a sua missão era colocar a Susep de volta nos trilhos, promovendo uma modernização de gestão. Assim, foram criadas "avenidas estratégicas" para promover não só uma reforma administrava, que, segundo ele, foi a grande conquista da gestão, mas também a reestruturação do órgão - a qual veio via edição de decreto presidencial em maio desde ano.

Essa nova estrutura, chamada por Westenberger de "nova Susep", trouxe a figura da diretoria de conduta, voltada ao atendimento do consumidor, garantia de competição no mercado e à diversificação de produtos a preços acessíveis. Também foi criada uma área de gestão de riscos e dada prioridade às "fintechs", que estão chegando ao mercado de seguros.

Fonte: Valor Econômico